Recentemente cientistas detectaram uma nova cepa do coronavírus em um paciente de Sorocaba, no interior de São Paulo. Segundo os pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), a variante de linhagem sul-africana possui maior capacidade de driblar o sistema imunológico dos indivíduos infectados e as vacinas já desenvolvidas possuem baixa efetividade contra ela.
Com poucas medidas restritivas e lenta cobertura vacinal, o Brasil pode se tornar o berço de novas variantes do coronavírus, como afirma o epidemiologista e coordenador da Sala de Situação da Universidade de Brasília (UnB), Jonas Brant.
“Essa é a grande cobrança que o mundo vem fazendo das estratégias de enfrentamento do Brasil. Porque hoje o Brasil se tornou o país com a maior transmissão do mundo e podemos ser o celeiro de uma nova variante – que pode surgir a qualquer momento – que escape da vacina”, comenta.
Quais cepas do coronavírus circulam pelo Brasil?
O que são as novas cepas do coronavírus?
O professor da Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão Preto, Domingos Alves, critica a falta de protocolos e medidas sanitárias para conter a disseminação do coronavírus dentro do território nacional.
“O Brasil nunca teve um programa para conter a disseminação do vírus. Quando se fala hoje que a cepa de Manaus tem uma prevalência acima de 80% no país, é porque nunca foram tomadas medidas para contenção da disseminação dessa cepa, dentro do próprio país.”
A epidemiologista da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Maria Rita Donalisio, explica que o Brasil é um terreno propício para que as mutações convirjam entre si e gerem novas cepas mais resistentes.
“É um terreno fértil: grande circulação de pessoas, pouca testagem, poucas estratégias de prevenção. Com muitos casos [da doença] a gente aumenta a possibilidade desses erros de codificação genética, dando chance para as mutações. O grande risco é o vírus mutante driblar a imunidade do indivíduo”, explica.
Vacinação
Domingos Alves explica que a vacinação induz a uma proteção coletiva contra o coronavírus, diminuindo a possibilidade de criação de novas cepas.
“A vacina propriamente dita não tem como interromper o ciclo de criação de novas cepas. O fato de você ter uma grande parcela da população vacinada, interrompe um ciclo de infecção do coronavírus e diminui a possibilidade desse vírus de criar mutações”, esclarece.
Até a última terça-feira (27), o Brasil já havia distribuído 57.966.218 doses de vacinas contra a Covid-19 aos estados. Dessas, 39.348 já foram aplicadas. Os números podem ser conferidos no site Localiza SUS.
A epidemiologista Maria Rita Donalisio, afirma que quem já teve Covid-19 deve se vacinar. “Muitas vezes uma primeira exposição ao vírus não é suficiente para proteger o indivíduo de uma segunda infecção. Principalmente se for uma variante. Nós não sabemos ainda quanto tempo dura a imunidade; quem já se contaminou, quanto tempo vai durar aquela infecção. São temas que necessitam de estudos”, ressalta.
A especialista ressalta que existe a possiblidade da vacina contra a Covid-19 ser aplicada anualmente, como já acontece com a Influenza. Nesse caso, a comunidade de saúde se reúne todos os anos para analisar a cepa predominante e, com isso, definem a melhor vacina a ser aplicada na população.
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Reinfecção
Segundo Donalisio, uma pessoa que já se contaminou com o coronavírus pode ser reinfectada. “Alguns estudos têm demonstrado que as reinfecções podem ser mais frequentes do que nós suponhamos, até com sintomas mais graves. Porque não foi possível construir uma memória imunológica suficiente, na primeira infecção, para proteger [o indivíduo] de uma segunda infecção”, explica.
O professor Domingos Alves comenta que mesmo depois de vacinado, o indivíduo pode se infectar novamente com o coronavírus, mas – se imunizado – não irá desenvolver um quadro grave da doença.
“Se você, sem vacina, tem um quadro de reinfecção, ela pode ser mais grave. Você pode ter tido uma primeira infecção, sem sofrer internação, e na segunda sofre até uma internação mais grave. A probabilidade, com a Coronavac, é 100% de chance de não ter um caso grave”, explica.
No Brasil, há poucos dados sobre reinfecção, já que para determinar se houve duplo contágio é necessário fazer um sequenciamento genético do vírus na primeira e na segunda infecção. Também deve haver um espaço de pelo menos três meses entre elas.
Vacinas desenvolvidas
Por enquanto, as vacinas desenvolvidas ainda são capazes de proteger contra as novas variantes do coronavírus. “Os ensaios clínicos que temos sobre a eficácia das vacinas disponíveis no Brasil mostram que a Coronavac e a AstraZeneca têm eficácia, principalmente, contra casos graves e mortes por Covid-19”, afirma a epidemiologista Maria Rita Donalisio.
Em alguns estudos com variantes de preocupação, como a B.1.1.7 (Reino Unido), as vacinas testadas se mostraram eficazes, especialmente a AstraZeneca. Apesar de diminuir um pouco a resposta imunológica, a eficácia foi suficiente para evitar casos graves e mortes pela Covid-19.
No caso da cepa da B.1.351 (África do Sul), a resposta foi um pouco menor; mesmo assim os pesquisadores afirmam que as vacinas ainda são competentes para impedir estágios avançados da doença.
Já contra a variante P.1 (Manaus), alguns estudos – apesar de precoces – mostram que o grupo de vacinados, tanto pela Coronavac, quanto pela AstraZeneca, estão protegidos da Covid-19.
O professor da USP, Domingos Alves, adverte que os estudos ainda são preliminares. “Esses estudos precisam ser mais abrangentes. À medida que for se vacinando as pessoas, [deve-se] observar se essas vacinas foram contundentes contra as cepas que estão aparecendo”, ressalta.
Medidas de prevenção
Além da vacinação, o epidemiologista Jonas Brant, afirma que as medidas de prevenção para as novas cepas do coronavírus continuam as mesmas: uso de máscaras, manter os ambientes ventilados, evitar aglomerações, higienizar as mãos etc. Ele também recomenda reforçar a filtragem das máscaras.
“Nesse momento em que a probabilidade de entrar em contato com pessoas com vírus é cada vez maior, o uso da máscara de pano deve ser substituído pela máscara cirúrgica, por baixo da máscara de pano, ou pela máscara N95 ou PFF2. O uso de filtragens melhores pode garantir maior proteção.”